O GOVERNO DA TROIKA

A Chegada da Troika.


   O pacote de ajuda financeira prestado pela troika à República Portuguesa veio em troca de reformas estruturais «com vista a corrigir os desequilíbrios externos e internos e a aumentar o potencial de crescimento e de emprego», como descrito no memorando assinado por Portugal em Maio de 2011.

  Num sistema de avaliações intervaladas, por cada ponto positivo, a troika libertava porções do montante total da ajuda financeira prevista para o país. Contudo, com a entrada de dinheiro para efeitos de redução da dívida pública, vinham anexadas novas medidas de austeridade para recuperar a confiança dos mercados financeiros. 

  Esta austeridade, porém, não seria conduzida por Sócrates, pois seria Pedro Passos Coelho a governá-la no que ficou conhecido entre os portugueses como "o Governo da troika", após ganhar as eleições antecipadas em junho de 2011. O PSD responsabilizou-se pelas medidas de austeridade necessárias, tendo estas abrangido cortes nos salários, nos subsídios de natal e férias, nas pensões e com um enorme aumento de impostos.


| Mercado de trabalho

     Entre as ações previstas pela Troika para Portugal relativas aos salários e pensões destacam-se os cortes aos vencimentos dos funcionários publicos.

   Estes impostos fizeram os trabalhadores, tanto do público como do privado, perder uma percentagem do seu salário, mediante uma sobretaxa no IRS. Quem pertencia ao setor privado, enfrentou um dos seguintes cenários: 1) manteve o emprego, fornecendo o seu labor a troco de um salário não correspondente e que não permitia uma melhoria da sua qualidade de vida, aliás, pelo contrário, pois a classe média portuguesa neste período de tempo empobreceu subitamente; 2) perdiam o seu emprego, pois os empregadores não conseguiam manter as empesas a funcionar enquanto pagando salários a um número excessivo de pessoas. 

   Os funcionários públicos embora tivessem a segurança do emprego, tal não significava que vivessem bem. Além dos referidos cortes nos salários, os trabalhadores do Estado também perderam o subsídio de Natal e de férias, assim como os pensionistas. 

    A perda de dois subsídios por parte dos pensionistas foi aplicada a todos aqueles que ganhassem mais de 485 euros de reforma. Cerca de 716 mil pessoas deixaram de poder usufruir dos subsídios de Natal e férias (1)

    Estas medidas facilitaram os despedimentos, pondo termo a cerca de 50 mil empregos entre 2012 e 2013, tendo o número de funcionários públicos caído para quase 8% (2). Simultaneamente, permitiram o congelamento e redução de salários, que também provocou o desemprego. A propósito da matéria salarial, Fernando Martins, economista do Banco de Portugal, afirmou que "a proporção de empresas que congelaram salários de base aumentou de 25% em 2010 para quase 40% em 2013" (3), o que revela a degradação da qualidade de vida dos Portugueses.

(1) Dinheiro Vivo (2011). "Um terço dos reformados fica sem subsídio de férias ou Natal em 2012 e 2013", publicado a 13 de outubro de 2011.

(2) Público (2014). "Função pública perde quase 50 mil empregos em dois anos", edição online de 12 de maio de 2014.
(3) Abrilabril (2016). "Com a troika ficou mais fácil despedir e baixar salários", publicado a 3 de agosto de 2016.


| Transportes.

  No setor rodoviário e ferroviário, os passes sociais, referentes aos passes de transporte público daqueles que vivem em condições mais difíceis, também viram cortes, com o Governo a pôr fim aos descontos de 50% para estudantes e reduções automáticas para maiores de 65 anos (4). Ao mesmo tempo, também se viu o preço do serviço nas áreas metropolitanas de Lisboa e do Porto registar um aumento de 20%, entre 2011 e 2012 (5), impactando diretamente a vida daqueles que necessitavam de se deslocalizar para o emprego, ou seja, não havia maneira de escapar à despesa adicional. Este aumento dos bilhetes, porém, já se via previsto numa futura revisão do «regime de tarifação da infra-estrutura para introduzir um regime de desempenho», como assinado no Memorando de Entendimento. 

(4) Expresso (2012). "As 50 medidas de austeridade entre junho de 2011 e agosto deste ano", edição online de 3 de outubro de 2012.

(5) Expresso (2011). "Transportes: aumento das tarifas foi exigência da troika, diz Passos", edição online de 22 de julho de 2011.


| Impostos e mais cortes.

   A austeridade também influenciou o trabalho. Destaco o corte efetuado no subsidio de desemprego, que passou a durar metade do tempo, tem um teto máximo 20% mais baixo e reduz progressivamente até 10% do valor inicialmente pagos (6). Tais medidas, como podemos concluir, foram elaboradas com o intuito da população desempregada ter menos margem para rejeitar propostas de trabalho, incentivo o regresso à vida ativa.

   A população empregada, porém, não vivia necessariamente em condições dignas, pois trabalhavam mais horas (passou de 35 para 40 horas) e mais cortes foram efetuados no salário mínimo nacional em 2013, com a anunciada subida da TSU (Taxa Social Única) dos trabalhadores, ou seja, em função do seu salário, trabalhadores teriam que contribuir uma maior percentagem que anteriormente para a Segurança Social. 

   Em teoria esta medida estava alinhada com o conceito de um Estado-providência, contudo, a população empregada, suportando tantos impostos, via-se cada vez mais no limear da pobreza e, concomitantemente, o país parecia estar agarrado a um ciclo vicioso, composto por austeridade, empobrecimento e ajuda aos mais desfavorecidos. O problema é que, se existem mais pessoas a entrar na pobreza do que aqueles que conseguem se escapar dela, então cada vez mais a população empregada teria que canalizar uma maior porção do seu ordenado para efeitos de ajuda social, consequentemente, esses pioravam a sua qualidade de vida e eles próprios viam-se mais próximos da pobreza.

   Quando se pensa em mobilidade social, por vezes se esquecemos a faceta menos agradável, que é o movimento descente. Durante a crise a classe média portuguesa manifestou uma grande dificuldade em manter o estilo de vida consumista dos tempos prévios à troika. Contudo, com medidas como o aumento do IVA de 6 para 23% em vários bens e serviços, as poupanças das famílias portuguesas, especialmente daquelas que pretendiam reduzir custos, sofreram um duro impacto. 

    A popularidade do Governo do PSD via-se em queda com tais medidas, mas ainda mais porque o Povo via o primeiro-ministro Passos Coelho a não cumprir a sua palavra. 

   Antes de subir ao cargo de chefe do Governo, Pedro Passos Coelho havia rejeitado o aumento dos impostos, afirmando que o IVA não iria subir, mas que seria para reestrutrar, isto significando que «nas três taxas já existentes, temos de reclassificar produtos e serviços de modo a alargar a receita»(7). Três anos mais tarde, porém, em 2014, o mesmo aumentava a taxa máxima do IVA para 23,25%(8), justificando que lembrou o país ainda tinha um défice para reduzir, tendo também garantido que esta redução seria feita sem o aumento impostos ou necessidade de recorrer ao rendimento das pessoas.

   Famílias viram o IVA da eletricidade e do gás, em 2012, a passar de 6 para 23%. Com base no inquérito do INE aos gastos das famílias, entre 2005 e 2011, verifica-se que a conta do gás subiu 76,6% e a da eletricidade 25%. 

  O grupo empresarial também se viu cercado com medidas que dificultaram o empregar de mais portugueses. Criou-se, por exemplo, um novo escalão da derrama estadual, para lucros tributáveis acima de 10 milhões de euros, que passam a ser tributados a 5% adicionais. Também em impostos tradicionais como o IRC, viu-se uma taxa adicional de 3% para as empresas com lucros acima de 1,5 milhões de euros.

(6) Expresso (2012). "As 50 medidas de austeridade entre junho de 2011 e agosto deste ano", edição online de 3 de outubro de 2012.

(7) Jornal de Notícias (2011). "Legislativas 2011: Passos Coelho rejeita aumento de impostos", edição online de 11 de maio de 2011.
(8) Jornal de Negócios (2014). "Governo aumenta IVA para 23,25% e agrava TSU aos trabalhadores", edição online de 30 de abril de 2014.


| Saúde.

   As medidas de austeridade não afetaram apenas as carteiras dos portugueses e como estes faziam dinheiro mas também condicionaram a saúde, sendo algumas destas medidas (9):

  • Cortes na comparticipação no transporte dos doentes (menos 30%) pagos aos bombeiros;
  • Cortes de 200 milhões de euros nos custos dos hospitais, no sector dos medicamentos (preços, margens de lucro das farmácias e grossistas, por exemplo);
  • Cortes nos reembolsos aos utentes do SNS, nomeadamente no transporte de doentes;
  • Redução de 12% a 12,5% nos preços dos exames convencionados;
  • Duplicação das taxas moderadoras.

   Assim, o acesso das pessoas aos cuidados de saúde viu-se condicionado por fatores económicos, desfavorecendo, claramente, aqueles que possuíssem menos recursos. Embora na perspectiva econômico-financeira os resultados tenham sido positivos, o povo português sofreu bastante com estas mudanças, fazendo com que, na altura da crise, o usufruto do SNS fosse quase um ato elitista.

   Os cortes nos reembolsos aos utentes do SNS em relação ao transporte de doentes tiveram como consequência direta a privação dos pacientes recorrerem aos serviços de saúde por não terem condições de pagar as deslocações. A duplicação das taxas moderadoras, que limitou o acesso a muitas pessoas no acesso aos serviços de saúde tendo o valor da consulta de hospital subido de 4,6€ em 2011 para 7,75€ em 2013, assim como em situações de emergência hospitalar que subiram de 9,6€ em 2011 para 20,6€, em 2013 (10).

  As consequências destas medidas impactaram a vida dos portugueses muito rapidamente, sendo elas o empobrecimento, a desigualdade e a necessidade de emigrar em busca de melhores condições. Os que permaneciam em Portugal tentavam não sucumbir aos aumentos de preços em quase todas as áreas.

   Naturalmente, os Portugueses saíram à rua para manifestar a sua indignação perante as ações levadas a cabo por este Governo, sob mandato da Troika...

(9) Expresso (2012). "As 50 medidas de austeridade entre junho de 2011 e agosto deste ano", edição online de 3 de outubro de 2012.
(10) NUNES, Alexandre Morais e MATOS, Andreia Afonso de (2021). Austeridade em Portugal: medidas implementadas e seu impacto no acesso, eficiência e qualidade do serviço nacional de saúde.


Joana Matos
Concurso EUStory 2021 - XIV Edição

Powered by Webnode
Create your website for free! This website was made with Webnode. Create your own for free today! Get started